quarta-feira, novembro 30, 2005

Os Homônimos e Destino

Incendiaram um ônibus. Com gente dentro. De propósito, dirigido, vingativo.
Morreram cinco pessoas e entre elas Vitória, de dois anos, e sua mãe. O pai de Vitória, Rogério, é um pacato cidadão. Daqueles que comem barato, ganham pouco, trabalham muito, acordam cedo, chegam tarde em casa, mas não desistem. Em paz, com seu sorriso, limpa diariamente meu local de trabalho. Apesar da insatisfação com o salário, já que ninguém gosta de ganhar pouco, não se revolta.
- E aí Rogério?
- Tudo bem – Sempre sorrindo.
E ele lá, limpando os banheiros, o corredor, as mesas. Falando de futebol, do Lula, da vida.
Do outro lado da linha de fogo, no Morro da Fé, um outro Rogério é mais conhecido como Mica, apelido de infância. Comanda o tráfico local. Dorme tarde porque “trabalha” muito à noite e dizem que não tem hora para acordar. Perdeu um comparsa numa das intermináveis escaramuças entre polícia e tráfico. Diferente do seu homônimo, revolta-se. No seu mandato provisório, porque sua vida deverá ser curta devido aos riscos da sua “profissão”, determina a vingança. Contra quem não importa, isso é uma guerra, e contra-ataca. Matem alguém, sentencia.
A tropa, demente e violenta, bate num motorista e incendeia um ônibus. Com gente dentro. Inclusive Vitória, sua mãe e Rogério, seu pai.
A polícia chega, registra e explica didaticamente. A situação está sob controle, com cinco pessoas incendiadas e mortas.
Mais um registro policial insensível, diário, fruto de atitudes insensíveis, de governos insensíveis, de guetos pobres, medianos e ricos, cada vez mais insensíveis, quase insanos.
E quando misturamos insensibilidades, insanidades e força temos tudo para a guerra. Urbana.
As tropas medianas e ricas querem que a polícia mande bala, elimine. Os entrincheirados pobres não esperam a polícia, não contam com ela para representá-los nas ações, eles mesmos mandam bala e fogo. Um ódio recíproco que se alastra. Um governo constituído e outro paralelo, ambos sem lei, só força, insensibilidade e insanidade.
O Governador quer ser presidente. O traficante quer ser o rei do tráfico, o mais malvado. Ambos prometem segurança e uma vida melhor, que nunca chega.
Enquanto isso, Rogério está lá com 50% do corpo queimado, sem mulher e sem Vitória. Seu homônimo não terá um destino melhor.
Quem se arrisca a indicar o próximo?
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